Alguns anos atrás, eu estava na ponte aérea
voltando do Rio de Janeiro, em uma semana particularmente difícil. Era uma época
em que não me alimentava bem, não dormia bem, e vivi uma das épocas
mais difíceis da minha vida profissional. Quando entrei no avião
e sentei, fiz o óbvio: abri o computador pra trabalhar. Logo a aeromoça veio,
pedindo para eu fechar, dizendo que o voo estava lotado,
e que não era permitido. Na verdade, dizendo que estava
na saída de emergência e que não era permitido
o uso de computadores. Eu tentei mudar de assento, obviamente,
mas o voo estava lotado. Então como de costume, já estava
pronta pra colocar meu fone de ouvido, quando escutei a seguinte frase: “Por que você não aproveita esses
40 minutos pra você? Eles não vão mudar nada na sua vida.” Quando virei, um homem simpático
sorriu e continuou dizendo: “Sabe que já mudei do Brasil faz um tempo, mas me assusta cada vez
que eu venho pra cá, ver as pessoas trabalhando
e vivendo nesse ritmo, e ver que eu vivi exatamente assim.” Eu fiquei envergonhada, tentei jogar o assunto pra esporte,
maratona, bicicleta, mas logo ele me perguntou:
“E o computador hein? O que tem nele de tão importante?” Eu contei que trabalhava no LinkedIn, e ele me perguntou se eu conhecia
o Oswaldo, que era nosso CEO na época. Eu disse: “Claro!
De onde você conhece ele?” Então ele me disse: “Eu vim desse mercado. Fui eu que trouxe o Google
e o Facebook pro Brasil.” Gente, fiquei desesperada. Mil conexões passaram na minha cabeça.
Pessoas, frases, notícias… Eu sabia quem tinha trazido
o Google e o Facebook pro Brasil. Esse cara era uma referência pra mim. Mesmo superempolgada, naquele momento
contive a minha surpresa, agi naturalmente, e disse:
“Ah! Você é o Hagen?” E ele me disse: “Sou.” O fato de eu não saber quem era ele,
me deixou mais à vontade pra ser eu mesma. Pelo menos até aquele momento, né? A gente falou sobre diversos assuntos:
“startups”, empreendedorismo, projetos sociais, Google,
Facebook, Instagram. Podia dizer que tinha ido pra Europa. Mas já chegando em São Paulo, pensei: “O que eu poderia perguntar pra esse cara, que de alguma forma, poderia
mudar a minha carreira?” Então criei coragem e disse: “O que você olha
antes de contratar alguém?” Entendendo que ele deveria
ter contratado um time muito bom, pra essas empresas estarem
onde estão hoje. E ele me disse que olhava
basicamente cinco coisas, mas que tinha uma que chamava
muito a atenção dele, que era entender quem era aquela pessoa
fora do ambiente de trabalho. Ele me contou então um caso, de quando ele contratou
uma pessoa pro Google, pra área financeira, que era um palhaço
fora do escritório, e disse que aquilo tinha chamado
muito a atenção dele. Eu aproveitei e contei que no LinkedIn,
todos os meses a gente tem uma reunião com todos os funcionários da empresa, e que os novatos têm que ir
lá na frente se apresentar, e contar algo que não está
no perfil do LinkedIn deles. Que era uma maneira parecida
de descobrir essa habilidade. E já na fila do táxi,
nos despedindo então, ele me perguntou: “E me diz hein, o que não está no seu perfil do LinkedIn?” Eu fiquei um pouco sem graça,
não sabia muito o que falar, e acabei contando sobre um hobby
novo que tinha na época, e disse que era DJ. O que eu não podia imaginar,
é que ele ia virar superempolgado e dizer: “Mentira! Eu também sou DJ.” E foi nesse dia, no caminho
de volta pra casa, que eu comecei a pensar
sobre o profissional do futuro. Na verdade mais ainda sobre eu,
como uma profissional do futuro. Não é novidade para ninguém
que a tecnologia está mudando o mundo e nos levando pra um futuro
ainda desconhecido. Nos próximos anos, a Inteligência Artificial vai excluir
centenas de milhares de pessoas do mercado de trabalho, e esse é um problema em escala global que vai afetar a economia
de todos os países. E se por um lado já existe
um movimento pra esse assunto, me assusta ver que a maioria das pessoas
não fazem ideia sequer do tamanho dessa ruptura tecnológica
que está pra acontecer. E não estou falando de algo
que vai acontecer daqui há 200 anos, é uma mudança que já começou, e vais se intensificar demais
nos próximos 10 a 20 anos. A substituição de empregos
por robôs e softwares tem sido tema de diversos estudos, e um deles, da Universidade de Oxford, aponta que aproximadamente
47% dos empregos tendem a desaparecer
nos próximos 20 anos. E aqui não estou falando só de motoristas, operadores de telemarketing e corretores. Professores, médicos e advogados
também estão nessa lista. Atualmente, um site chamado WebMT, que é uma coleção de sites de saúde, em que as pessoas podem fazer
consultas online, recebe mais visitas do que todos
os médicos dos Estados Unidos. Já no mundo das disputas judiciais, todos os anos, mais de 60 milhões
de desacordos entre comerciantes do eBay, são resolvidos através de resolução
de disputas online. Ou seja, robôs
em vez de advogados e juízes. E se a gente pensa
que só nós profissionais, vamos ser transformados em robôs, o Vaticano concedeu
a primeira licença digital a um aplicativo chamado Confissão, que vai ajudar as pessoas
a se prepararem pra se confessar. E eu fico imaginando como será que vai ser se confessar pra um robô padre. Pois é… Se de um lado a gente tem esses milhões
de empregos desaparecendo, é claro que diante dessa nova economia,
muitos novos empregos vão surgir. Mas existe um ponto importante aqui. Se a gente olhar pra trajetória
da Revolução Industrial, quando os humanos foram
substituídos pelas máquinas, isso geralmente aconteceu
em trabalhos de baixa qualificação. Quando a gente não precisava mais
dos trabalhadores agrícolas, que representavam 80%
do mercado de trabalho na época, eles passaram a ocupar as vagas
nas indústrias que estavam surgindo. Ou seja, eles deixaram de arar a terra e passaram a apertar parafusos
nas linhas de montagem. Quando esses empregos
nas linhas de montagem começaram a ser automatizados também, eles passaram da linha montagem, pra serviços de baixa qualificação, que é onde essas pessoas estão hoje. Ou seja, até aqui
a gente sempre deu um jeito, né? Agora quando as pessoas dizem que haverá
novos empregos no futuro e que os humanos podem ser
melhores que a Inteligência Artificial, e que os humanos podem ser
melhores que os robôs, essas pessoas geralmente pensam
em trabalhos de alta qualificação, como pessoas que vão trabalhar
com robótica, com gameficação, com realidade aumentada… Eu não vejo como um motorista de caminhão
desempregado aos 50 anos, que perdeu seu emprego
pra veículos autônomos, nem como um caixa de supermercado
que não teve oportunidade de estudo, vai se reinventar
diante desses empregos do futuro, que vão exigir uma alta qualificação. E isso faz com que o mundo caminhe pra uma desigualdade jamais vista antes. Uma vez que os mais afetados
serão essas pessoas de baixa qualificação e de baixa renda. E aí? O que a gente faz com tanta gente
que vai ficar sem emprego? Muita gente diz que a solução pra isso é a possibilidade de se criar
uma renda básica universal, ou seja, oferecer uma renda básica
pra qualquer adulto independente dessa pessoa
trabalhar ou não. Eu confesso que fiquei chocada a primeira vez que ouvi falar
nesse assunto, mas ele vem ganhando cada vez mais
novos adeptos inclusive grandes nomes do Vale do Silício como Mark Zuckerberg e Elon Musk. Essa iniciativa é vista
como uma forma de compensar o desemprego gerado pela automação. Só que aqui não está claro
o que é universal nem o que é básico. Quando a gente fala em
renda básica universal, a gente pensa na verdade
no problema de forma nacional pra um problema que é global. E vou dar um exemplo aqui
pra gente entender melhor isso. Imaginem vocês que a Inteligência
Artificial e as impressoras 3D vão excluir milhões de trabalhadores
escravos em Bangladesh. Quem vai pagar a renda básica deles? Será que os Estados Unidos e a Europa vão recolher imposto do Google,
da Amazon, da Apple, e vão usar esse dinheiro pra pagar a renda básica dos bengaleses? Eu não sei o que vocês acham disso, mas eu particularmente não acho
que isso vá acontecer. E aqui também não está claro
o que é básico quando a gente fala
em renda básica universal. O que é básico pra vocês? Quais são as necessidades
básicas do ser humano? Algumas pessoas vão dizer
que alimento e abrigo são suficientes. Já outras vão dizer: “Educação
tem que fazer parte desse pacote”. Mas se a gente falar de educação,
de quanto tempo a gente está falando? Seis anos? Doze anos? PhD? Quando as pessoas perdem
a sua empregabilidade, a única coisa que vai lhes restar
é a renda básica universal. Então o que compõe essa cesta, é uma questão ética muito delicada. A gente tá falando do provável surgimento
de uma enorme classe de pessoas ociosas. E aí eu fico pensando… Será que essas pessoas
que reclamam tanto do trabalho, vão ficar felizes com essa possibilidade? Ou será que doenças como estresse, depressão, obesidade e até suicídio, vão se agravar ainda mais
diante dessa falta do que fazer? Então, como a gente se prepara
pra esse mundo, que a gente nem sabe
ainda bem qual vai ser? Afinal, quais são os empregos do futuro? Detetive de dados? Psicólogo de robôs? A verdade é que não tenho essa resposta. Não sei dizer quais são
os empregos do futuro, e acho que talvez ninguém
ainda tenha essa resposta. Do mesmo jeito que 10, 12 anos atrás a gente não sabia que iam existir
Youtubers, motoristas de Uber, desenvolvedores de aplicativo,
jogadores de liga off legends… A gente também não tem como dizer
quais serão os empregos do futuro. Sessenta e cinco por cento das crianças
que estão no ensino médio hoje, vão trabalhar em um emprego
que ainda não existe. Mas então como que essas escolas
e essas universidades se preparam diante de um futuro tão incerto? Eu já estive algumas vezes
no Vale do Silício visitando as universidades
mais inovadoras de lá. Eu visitei universidades sem campus,
universidades sem professores, colégios pra crianças superdotadas
que aprendem através de projetos com impressoras 3D, corte a laser. Fui numa universidade do Google
com a NASA que fica dentro da NASA. Eu vi muita coisa, muito legal
e muito interessante. Mas uma das que mais me chamou a atenção, foi um escola chamada Minerva School, em que além de várias coisas
superlegais que eles têm, eles têm um foco muito grande em desenvolver as habilidades
comportamentais de seus alunos. Foi lá uma das primeiras vezes
na vida que eu ouvi dizer, que as habilidades do futuro não serão as habilidades técnicas, e sim as habilidades comportamentais. Uma vez que com a Inteligência Artificial os robôs poderia aprender
quase qualquer habilidade técnica que a gente tem hoje, mas ao menos não tão cedo poderiam desenvolver
suas habilidades comportamentais. O World Economic Forum
reforçou esse “insight” quando listou e apresentou ali quais serão as dez habilidades
mais importantes pro profissional do futuro. E confirmou que todas elas, sem exceção, serão habilidades comportamentais
e não técnicas. Em outras palavras, pra ser bem-sucedido, esse profissional do futuro
vai ter de saber como pensar, e não mais o que pensar. A maioria das escolas e das universidades
hoje nos ensinam o que pensar, e não como pensar. A gente cresceu ouvindo dos nosso pais,
dos nossos professores, dos nossos chefes e da sociedade em geral, o que era certo e o que era errado. E diante de um modelo linear
industrial como aquele, se a gente fizesse o que era certo, a gente tinha uma chance muito grande
de sermos “bem-sucedidos”. Já na era digital, devorar nomes
e fórmulas já não faz mais sentido. As respostas estão prontas na internet. Isso não quer dizer que a gente não vai ter
que se desenvolver tecnicamente. A gente vai sim, ter que desenvolver
essas habilidades, e a chance delas estarem ligadas
à tecnologia e à codificação é enorme. Porém, a velocidade da mudança
das coisas vai ser tão grande, que essas habilidades técnicas
vão ter um prazo de validade muito curto. Em outras palavras,
esse profissional do futuro então vai ter que ser um “longlife learner”,
ou seja, ele vai ter que aprender pra sempre. Aquela história de que a gente vai estudar
até os 20 e poucos anos, e aí a gente vai entrar
no mercado de trabalho, e a gente vai fazer algumas pequenas
pausas pra uma MBA ou uma pós-graduação, não vão mais fazer nenhum sentido
diante dessa nova economia. Dizem inclusive que esse profissional do futuro vai ter
aproximadamente até cinco carreiras ao longo da vida. Isso se elas não acontecerem
ao mesmo tempo. O futurista Alvin Tofler disse que o analfabeto do século XXI não será aquele que não sabe
ler e escrever, mas sim, aquele que não souber aprender a desaprender e a reaprender. É claro que isso tudo são possibilidades, mas o que eu sinto, é que independente do que vai acontecer
no futuro, nós humanos hoje, estamos ficando
cada vez melhores em compreender o cérebro
e a inteligência. Mas a gente está evoluindo
cada vez menos a nossa consciência. E as pessoas confundem
inteligência e consciência. Inteligência é a capacidade
de resolver problemas, e consciência é a capacidade de sentir. A gente está criando
Inteligência Artificial, mas a gente não está criando
Consciência Artificial. Dizem que no ano de 2029, o computador vai se tornar
tão inteligente quanto nós, seres humanos. E que em 2045, um único computador vai ser mais inteligente
do que toda a humanidade junta. Porém, não há nenhum indício, de que esses computadores
vão se tornar conscientes. Ao menos tão cedo, eles não vão poder sentir. E se é isso que vai diferenciar
a gente dos computadores, isso que vai diferenciar
a gente dos robôs, a gente tem que começar a desenvolver
mais a consciência humana. A gente está cada vez mais
desenvolvendo a nossa externa, esquecendo de olhar pra dentro da gente. Cada vez mais nos é cobrado
que a gente seja o melhor profissional, o mais bem-sucedido, o mais inteligente,
o mais competitivo, mas ninguém ensina a gente
a lidar com as nossas emoções. Se a gente não aprender e não entender que a felicidade não está em ter e sim em ser, a gente vai continuar criando
mais e mais robôs humanos. Pois não é preciso ser um robô para agir como um. Então hoje quando eu penso:
“Quem será o profissional do futuro?” “Quem serei eu
como profissional do futuro?” Pra mim, o profissional do futuro vai sim
desenvolver as habilidades externas, mas se ele não desenvolver
os “skills” internos e conseguir equilibrar isso dentro dele, a chance dele viver uma vida medíocre
e infeliz será muito grande. Em outras palavras,
o profissional do futuro nada mais é
do que um ser humano do futuro. E hoje eu quando me perguntam: “O que não está
no meu perfil do LinkedIn?” Eu digo que além de ser DJ, eu venho acordando de anos
em que eu vivi anestesiada. Eu levei anos pra perceber que eu era uma perfeita ninguém. Que eu respondia a demanda da sociedade, as demandas do meu trabalho,
as demandas da minha família, menos as minhas. Até porque eu não tinha a menor ideia de quais eram as minhas próprias vontades, senão, atender as expectativas dos outros. E hoje quando me perguntam o que é
que me fez acordar de tudo isso, foi o amor. O amor em perceber, descobrir e aceitar a beleza das minhas próprias imperfeições. E vocês? O que é que não está
no seu perfil do LinkedIn? Obrigada! (Aplausos)
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